A importância da arquitetura de iluminação para o atendimento inclusivo

Quando entrei na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), fazia um trabalho voluntário para a AFAC (Associação Fluminense de Amparo aos Cegos) em Niterói (RJ), e acabei me interessando por arquitetura inclusiva! Mas, com o passar do tempo, fui deixando o assunto um pouco de lado.

sala para audiometria sem São Paulo

Durante o tempo que fiquei na universidade, falava-se muito em arquitetura inclusiva, mas sempre muito voltada para pessoas com mobilidade reduzida do ponto de vista físico (cadeirantes e idosos).

Após a formatura, acabei me dirigindo para o ramo da iluminação, cujo assunto é abordado apenas de forma técnica, tendo em vista a acuidade visual que o espaço precisa ter: mais uma vez, voltado para idosos e cadeirantes. Não que estes sejam menos importantes. De forma alguma! Mas, no meu ponto de vista, a arquitetura só pode ser considerada 100% inclusiva quando ela aborda TODAS as necessidades em sua concepção.

Voltando ao meu trabalho voluntário, uma vez perguntei a uma senhora cega, para quem eu lia, qual seria a sua casa dos sonhos, pois estava fazendo uma pesquisa para o desenvolvimento de um projeto da universidade. Ela não titubeou. Disse que, para uma pessoa que não enxergava bem, o melhor era que tudo pudesse ser o mais estático possível. Que mudar os móveis de lugar poderia causar um acidente. Levei aquela dica pra vida!

Havia uma coisa que sempre me intrigava: embora ela não enxergasse nada, sabia exatamente quando a luz estava escura para minha leitura. Um dia perguntei e ela me respondeu que algumas pessoas com deficiência visual possuem uma sensibilidade ao ofuscamento, o que fazia com que sentissem a luz, sabendo se estava claro ou escuro. Disse que algumas chegam a se sentirem incomodadas, precisando de proteção. Com isso, o ofuscamento e a luz demasiada tornaram-se grandes vilões para mim.

Quando meu escritório foi chamado para fazer o projeto de iluminação do consultório da FONOTOM, sob as recomendações de que deveria ser um projeto inclusivo, as dúvidas sobre como executar essa tarefa da melhor forma possível não foram diferentes. Uma arquitetura só é totalmente inclusiva quando atende a todos. E, no consultório da Dra. Andrea Soares e do Dr. Cleiton Fortes, seriam atendidas pessoas com pouca mobilidade, baixa visão e também crianças. E muitos com baixa ou nenhuma audição. Isso faria diferença em meu projeto?

“Ao contrário do que podemos acreditar, a perda de audição nem sempre é congênita. Mais cedo ou mais tarde isso pode acontecer com todos nós. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase um terço das pessoas com mais de 65 anos sofrem de perda auditiva incapacitante. A perda auditiva é mais uma "diferença" do que uma "deficiência". Embora as demandas espaciais das pessoas com impedimentos auditivos não sejam tão marcadas como espaços para cegos ou para aqueles com mobilidade reduzida, a redução da capacidade auditiva implica uma maneira específica de 'experenciar' o ambiente. É possível aprimorar essa experiência através do projeto de interiores?”.

Após uma conversa com os clientes e breve pesquisa, descobri que sim! Na verdade, alguns pontos, às vezes pouco abordados, viriam à tona nesse caso. Também aprendi que, não somente para o projeto em questão, algumas premissas seriam a base de qualquer outro projeto que virá futuramente.

Descobri a real importância da luz como sinalização. Não quero dizer que ela nunca tenha sido importante, mas, nesse momento, ela é fundamental. Uma luz mal posicionada pode causar confusão para quem não escuta direito na hora de se localizar. Essa pessoa pode ter dificuldade em pedir uma informação, por exemplo. Então, quanto melhor essa luz indicar uma saída, o início de uma escada, melhor.

Em espaços de convívio, é importante manter uma iluminação homogênea, onde todos possam ser vistos. Pessoas com deficiência auditiva comunicam-se de diversas formas, fazendo uso de dispositivos auxiliares, escrita, linguagem gestual e leitura labial em alguns casos. Esse cuidado também é necessário para pacientes com tontura.

Os espaços devem ser amplos e o mais circulares possível, facilitando um canal de panóptico, onde todos os participantes podem se ver. Nesse ponto, a iluminação pode contribuir, proporcionando uma luz agradável para que ninguém se sinta ofuscado nem com dificuldades de enxergar o outro. Ambientes acusticamente tratados, muitas vezes, possuem um material mais poroso e/ou escuro, o que pode absorver a luz em demasia. Mais do que nunca, saber exatamente que material será utilizado é fundamental para não se dimensionar luz de menos. Lembrando que dimensionar luz a mais, além de ser economicamente desnecessário, pode causar ofuscamento.

No caso da sala acústica para audiometria, os materiais eram todos claros, o que não resultou em nenhuma demanda especial. Mas essa falta de demanda deve-se a uma conversa bastante clara com o fornecedor do material e com a cliente.

Para a sala de otoneurologia o conceito da iluminação foi diferente. Precisávamos criar duas situações distintas, onde o profissional precisaria de muita luz na hora da consulta e de pouquíssima luz na hora do exame , já que este consiste em projetar imagens em uma tela em tempo real. Nessa sala também acontecem os exames para tontura com vídeonistagmografia, cuja imagem dos olhos é projetada na parede durante a avaliação otoneurológica. Para isso o uso dos trilhos e projetores foi utilizado, já que permitem uma melhor focalização, além de trazer um toque mais moderno, seguindo o estilo do cliente.

Em resumo, a conclusão que cheguei no final desse projeto é que existe, sim, um cuidado especial quando falamos de projetos inclusivos. Mas que, na minha opinião, deve ser tomado em todos os projetos, visando à inclusão como principal preocupação em um ambiente.

Obviamente precisamos levar em conta o espaço a ser projetado. O programa de uma residência é totalmente diferente daquele de uma loja, de uma escola ou de um espaço de saúde. As necessidades, dimensões e usos são diferentes, assim como a utilização da luz. No entanto, hoje, tenho a convicção de que em um espaço, quaisquer que sejam suas necessidades e seus usuários, precisa ser projetado para garantir conforto e inclusão.

Texto: Maria Fernanda Fellows - Arquiteta de Iluminação (CAU/RJ: A121878-6)

Arquiteta especializada em iluminação artificial. Coordenadora dos projetos de iluminação de dois escritórios: E27 Iluminação

sala acustica para audiometria
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